Neste artigo damos algumas dicas de como você pode treinar seus gestores a realizarem a devolutiva de uma avaliação de desempenho
A devolutiva de uma avaliação é um momento estressante e cheio de ansiedade, tanto para gestores quanto para liderados. Gestores, de um lado, tendem a ficar desconfortáveis com conversas difíceis como, por exemplo, tratar da performance sub-ótima de um membro de sua equipe. Liderados, por outro lado, ficam nervosos pois recebem devolutivas de baixa qualidade, que agregam pouco valor às suas carreiras e são extremamente mal conduzidas.
👉 O objetivo deste artigo é que você, gestor de RH, consiga treinar seus gestores para que estes conduzam devolutivas da maneira correta, de modo que a reunião agregue valor para gestores e liderados e que ela permita o fechamento do processo de avaliação de desempenho com chave de ouro.
A ideia é que com esse artigo você possa construir um treinamento objetivo que gere muito valor para seus clientes internos.
Por que esse tema é importante? 🤔
A melhor forma de ressaltar a importância das avaliações de desempenho para um gestor é usar citações de Andy Grove, ex-CEO da Intel (posição que ocupou por mais de 20 anos) e autor do livro High Output Management.
Grove dedica um capítulo inteiro do seu livro ao tema, e faz observações como:
"Fazer avaliações de desempenho, e comunicá-las, é a forma mais importante de feedback que um gestor pode dar. É como avaliamos a performance dos nossos liderados e como comunicamos essa avaliação a eles individualmente."
"Qual é o propósito fundamental da avaliação de desempenho? (...) Melhorar o desempenho do avaliado."
"A sua avaliação impactará - positivamente ou negativamente - o desempenho do seu liderado por um longo período de tempo, o que faz da avaliação uma das atividades de maior retorno de um gestor."
🟣 Ou seja: é um tema muito importante, central às responsabilidades de um gestor e de altíssimo retorno, pois gera impacto a longo prazo e toma relativamente pouco tempo.
Para que serve uma avaliação de desempenho?
A avaliação de desempenho - e sua comunicação - servem dois propósitos. Se a empresa e os seus gestores já praticam feedbacks contínuos, fazem 1:1s regulares e conversam sobre performance durante o ano, a avaliação de desempenho tem como único objetivo ser o fechamento do ano, no qual são comunicadas as decisões tomadas por performance (como promoções, mudanças de função e alterações na remuneração do colaborador).
No entanto, essa não é a regra e sim a exceção, infelizmente. A grande maioria dos gestores não dá feedbacks contínuos, nem fala sobre performance e muito menos faz 1:1s regulares. Por isso, a conversa tende a ser muito mais carregada de ansiedade (dos dois lados) e pode gerar surpresas.
Nesta cultura, em uma avaliação de performance anual por exemplo, apenas uma vez ao ano seria tratada a performance do colaborador, ou seja, somente depois de 12 meses haveria um acompanhamento de sua evolução, o que é um intervalo muito longo para a busca de desenvolvimento ascendente.
Nesses casos, em que não há cultura de desenvolvimento de performance, a avaliação de desempenho deve servir como o começo - o kick-off - de um processo futuro de desenvolvimento. Ela deve ser vista e executada como o primeiro passo de uma jornada, o momento no qual o gestor e liderado "zeram a pedra", "lavam a roupa suja" da performance, e recontratam suas expectativas para o futuro.
Isso levanta um ponto interessante: nenhum gestor deve achar que uma avaliação de desempenho vai mudar fundamentalmente o desempenho de um colaborador. Há uma citação americana que ilustra esse ponto - e que deve ser usada pelo RH - "o jeito comum de se fazer - e comunicar - avaliações de desempenho é a mesma coisa que fazer dieta no dia do seu aniversário e se perguntar por que você não está perdendo peso." Quando não há cultura de performance e desenvolvimento, seus gestores devem entender que a avaliação de desempenho é um começo incrível para uma dieta e uma reeducação alimentar.
💡 Como fazer o processo ser mais fácil
O primeiro passo para fazer com que a devolutiva de uma avaliação de desempenho seja menos traumática é a prática. Como vimos aqui há pouco.
O segundo passo é um preparo meticuloso por parte do gestor para que seja realizada uma avaliação de desempenho excelente e, posteriormente para que essa avaliação seja comunicada de maneira excelente também. Nesse artigo, vamos falar um pouco dessa preparação que um gestor deve fazer para o momento da comunicação: a devolutiva da avaliação de desempenho.
Por fim, o terceiro passo é seguir um roteiro pré-determinado para o momento da devolutiva, e seguir algumas regras de bolso de como conduzir essa reunião.
Como se preparar para a devolutiva
A preparação da devolutiva envolve algumas etapas a serem executadas pelo gestor. A primeira delas é organizar as evidências que deram base às avaliações.
🟪 Evidências
Aqui, servem comportamentos, participações, resultados, projetos e tudo o mais que possa servir de base para as opiniões do gestor. Algumas ideias de evidências:
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E-mails antigos que tenham sido trocados pelo liderado, e que sejam ilustrativos
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As metas contratadas ao longo do ano com o liderado, seu status e eventuais observações
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Registros de 1:1s e conversas importantes realizadas
Esse preparo tem como objetivo dar argumentos ao gestor que possam ser usados caso o avaliado, o liderado, não concorde com algumas das avaliações (se a avaliação da sua empresa possui competências, aqui valem evidências que justifiquem as avaliações do gestor em cada uma das dadas competências).
Importante ressaltar que as evidências são fatos e dados, ou seja, situações do passado que realmente aconteceram. Elas têm a função de embasar a avaliação do gestor e evitar o "achismo". Em vez de dizer "Acho que sua comunicação não é boa", deve-se trazer fatos/dados, por exemplo, "Ontem, na reunião com a diretoria, você não foi clara ao apresentar o projeto pois não explicou o objetivo e suas etapas, o que impactou no entendimento da relevância do projeto e, consequentemente, na sua aprovação"
🟪 Mensagem chave
A segunda etapa é desenvolver a mensagem chave de cada um dos critérios da avaliação (p.ex., cada uma das competências) e uma mensagem principal geral, quando necessário. Aqui, o gestor tem que se lembrar que a devolutiva é uma reunião carregada de ansiedade e emoções. Por isso, o seu liderado terá ainda mais dificuldade de reter as informações transmitidas do que o normal. Uma das Leis de Horstman, um pensador da gestão de projetos, diz que "se você falar uma coisa sete vezes, metade do seu time dirá - e pensará - que ouviu você apenas uma vez". Ou seja, é importantíssimo desenvolver algumas mensagens chave que possam ser repetidas algumas vezes.
Para ilustrar esse ponto, vale contar uma história sobre a Amazon e seu fundador, Jeff Bezos. Bezos acredita muito na importância de destilar sua mensagem ao seu essencial e repeti-la incansavelmente. Para fazer isso com a estratégia da Amazon, e gerar alinhamento em seus mais de 50 mil funcionários, Bezos se pôs a pensar no que não ia mudar no seu negócio pelos próximos 50 anos. Ele acredita que se focar no que "nunca" vai mudar, sua empresa irá muito bem. Assim, pensando chegou à determinação de que as três coisas que em 50 anos não vão mudar são que os clientes da Amazon sempre vão buscar:
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Mais variedade de produtos (conveniência)
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Preços mais baixos
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Entregas mais rápidas
Então Bezos passou a comunicar esses três pontos de maneira extremamente repetitiva, para que qualquer um dos colaboradores da empresa os tenha em mente no seu dia a dia. As mensagens chave devem ter o mesmo efeito.
Caso o processo de avaliação de desempenho da sua empresa tenha uma nota ou conceito final, invariavelmente a mensagem chave será composta em parte por essa nota/conceito. IMPORTANTE: Se não houver uma nota/conceito no processo (o que nós indicamos fortemente que aconteça), o gestor deve pensar, quando achar que o colaborador está entregando abaixo do esperado, em algum tipo de adjetivo que deixe isso claro. Portanto, nos casos de baixa performance, o gestor pode sim dizer algo como "seu desempenho está abaixo do esperado por causa disso, disso e disso". Para todos os outros casos, principalmente quem está atendendo as expectativas, esse adjetivo reducionista não é necessário. Vale focar a mensagem chave nos quesitos e critérios e áreas que o colaborador está deixando a desejar e nas que está mandando bem. Portanto, resumimos:
Se há um conceito final no processo:
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O conceito final aparece na mensagem chave
Se não há um conceito final no processo:
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Se o liderado está com baixa performance: Basear a mensagem chave em um adjetivo com "cara" de conceito final
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Se o liderado não está com baixa performance: Basear a mensagem chave nos pontos fortes e a desenvolver
🟪 E-mail de logística
A terceira etapa é enviar um e-mail ao liderado com alguns itens importantes sobre a devolutiva com em torno de uma semana de antecedência. O texto desse e-mail deve comunicar a logística da reunião: onde, quando - dia e hora - e como ela vai se dar. O texto desse e-mail, que você pode sugerir a cada gestor, pode ser algo como:
"Fulano, tudo bem?
Estou escrevendo pra te lembrar que temos nossa reunião de fechamento do ciclo de gestão de desempenho no dia 18 de Agosto, às 13 horas na sala Smilinguinte.
Estou animado para sentarmos para conversar, e discutirmos seu ciclo e fazermos planos para o próximo.
Até lá, peço que você se prepare relembrando sua autoavaliação e que levante perguntas que queira fazer.
A reunião vai seguir a seguinte estrutura. Vamos falar:
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Sobre a agenda do papo
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Sobre o ciclo e seu desempenho de maneira geral
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Sobre cada um dos pontos da avaliação, começando pelos sobre os quais concordamos e depois os que não concordamos
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Sobre os planos e perspectivas para o próximo ciclo
Importante: nossa reunião terá um tempo limite de 1 hora. Caso não consigamos terminar todos os assuntos, estarei à disposição para marcar mais 1 hora contigo. Mas é importante que possamos cobrir todos os pontos centrais na primeira.
Por favor me avise se recebeu - uma simples resposta está ótima.
Abraço,
Cicrano"
Como conduzir a devolutiva
Chegamos à parte principal do nosso material: preparar o gestor para conduzir a devolutiva. Como falamos agora há pouco no modelo de e-mail, a estrutura da devolutiva deve ser:
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Agenda da devolutiva: como a reunião vai ser
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Mensagem chave que traduza de maneira simples a avaliação de desempenho do liderado
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Discussão de cada um dos pontos da avaliação, começando pelos sobre os quais concordam e depois passando para os quais não concordam
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Reforço sobre a mensagem chave
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Planos e perspectivas para o próximo ciclo, incluindo novas/maiores/menores responsabilidades, promoções, planos de desenvolvimento e metas
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Reforço sobre a mensagem chave
🟪 Agenda
Na agenda da reunião, é importante que o gestor passe pelas "regrinhas" do papo.
A sugestão é que ele fale sobre três temas: em primeiro lugar, que há um limite de tempo que deve ser seguido de 1 hora. Isso ajuda a conversa a ser produtiva e focada. Para isso, inclusive, vale a estratégia de ter um relógio na sala à vista para os dois, e que o liderado veja o gestor consultar o relógio duas vezes na segunda metade da devolutiva. Saber que o gestor está com a mão no tempo ajudará ainda mais a discussão a se manter produtiva.
A segunda é que não sejam feitas comparações por parte do gestor e do liderado com outros colaboradores da empresa, algo que é muito comum. Isso ajuda muito a discussão a ficar nos trilhos. É importante que o gestor reforce que sempre haverá visões diferentes sobre o desempenho das diferentes pessoas da empresa, e que esse assunto é "fora dos limites" da devolutiva.
A terceira "regrinha" é que os dois devem se manter profissionais, sem ataques pessoais, ofensas nem tom de voz inadequado. Ambos não devem "levar para o pessoal".
🟪 Pontos de discordância
A parte mais polêmica da devolutiva tende a ser a discussão sobre os pontos sobre os quais gestor e liderado não concordam.
Para isso, é muito importante que o gestor faça seu preparo devidamente, e tenha evidências que ajudem-no a defender suas visões. É possível que o liderado ofereça evidências contrárias, e para isso o gestor deve responder "obrigado pelos pontos. Eu os levei em consideração na construção da minha avaliação. E deixe-me dar algumas outras informações que possam te dar mais conforto, como a situação a, b e c por exemplo." Se mesmo assim não houver concordância relaxe: não precisa haver concordância em tudo: você é o gestor. Mas se o trabalho foi bem feito, essa chance é mínima. Por isso se prepare.
Algumas dicas que sempre ajudam o gestor:
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Sorrir
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Olhar no olho
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Falar de maneira calma, pausada e em tom adequado
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Tratar o liderado pelo seu nome
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Não interromper o liderado em hipótese alguma
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Deixar o liderado te interromper se ele quiser
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Manter a cuca fresca
🟪 Emoções
Caso o liderado se emocione, é prudente que o gestor tenha um pacote de lenços consigo (de maneira discreta), e que os ofereça ao liderado apenas quando e se ele se emocionar. Mantê-lo à vista pode deixá-lo preocupado ou com medo.
Outra dica: se o liderado se mostrar irritado ou responder de maneira emotiva, na defensiva ou inadequada, o gestor deve ser empático: "entendo por que você está se sentindo assim" é sempre uma boa resposta.
Caso comecem a entrar em uma discussão improdutiva, o gestor deve encerrar a reunião e retomá-la em outro dia (não deixar passar mais de 1 semana para isso) e deixar claro que ambos devem refletir sobre os pontos de discordância e sobre como a conversa pode ser mais positiva na próxima reunião. Essa estratégia deve ser usada em último caso, mas não há problemas em utilizá-la. O importante é que o gestor tenha consciência que a discussão se tornou negativa e precisam de um intervalo para retomá-la.
⚠️ Importante: sugerimos que a reunião seja realizada em um local tranquilo e mais reservado para que o liderado sinta-se o mais confortável possível para conversar sobre seu desenvolvimento sem interrupções ou preocupações que outras pessoas possam ouvir o conteúdo da conversa. Vale combinar com o liderado o que funciona melhor para ele 😄
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